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CAPÍTULO 27

 

                Nick tremia. Usava um pijama de palhacinho com rasgos na blusa e nas pernas que deixavam entrever os hematomas que começavam a se formar. Os pés estavam descalços e feridos. O olho esquerdo exibia um tom arroxeado. O menino tentava se manter firme, enxugando o rosto e o nariz que escorria, com a manga da roupa, duas, três vezes, como a criança que era. Joe gemeu baixo e sem uma palavra o puxou e o abraçou forte.

                O irmão estremeceu em seus braços e começou a soluçar.

                Não precisou perguntar o que havia acontecido, ou até que ponto o doutor tinha ido. A calça do pijama ensanguentada era o bastante para Joe se arrepender de ter acreditado que a paternidade era empecilho para o monstro. Colocou o garoto para dentro e lhe deu um chá. O menino se sentou na ponta da cadeira e tremeu levando a xícara aos lábios. Joe sentiu o peito arder de ódio pensando no que fazer quando Nick levantou e pediu para tomar banho.

               — Se puder me arrumar umas roupas vou tomar banho e voltar para casa. — Disse baixo sem olhá-lo. — Prometo que nunca mais vou te amolar.

                — Não pode tomar banho. Precisamos ir ao centro médico!

               — Ao centro médico? Por quê? 

                — Nick você está... machucado. Precisa ser examinado. Eles vão ajudar e... vão chamar a polícia.

                — Polícia?! Não! Não!

                — É o que temos que fazer depois do que aconteceu...

                — Não aconteceu nada. Eu sou sonâmbulo. Tive uma crise e vim para aqui.

                — Nick... Você foi... você está machucado.

                — Me machuquei no caminho.

                — Nick nós... nós precisamos denunciá-lo. —Tentou tocá-lo.

                — Não! — Envergonhado desviou do toque. — Ele é meu pai! Meu Deus ele é meu pai! Ele não fez nada comigo. Não pode ter feito.

               — Se não falar ele não vai parar e tudo será pior, muito pior.

                — A culpa é sua! — Gritou descontrolado empurrando a louça da pia para o chão. — Sua! Ele disse que você sempre se insinuou para ele. E você mesmo disse que sempre foi gay. Tinha que começar com alguém e foi se insinuar justo com ele.

                — Hei! — Joe gritou chocado. — Não está sendo justo! O que fez com você hoje repetiu várias e várias vezes comigo porque me calei!

               — Você se calou por anos e agora quer que eu fale? Quer que a vergonha seja minha? Eu... — Tremia, chorava, sofria. —     Ninguém vai saber dessa merda. Ninguém. Nem a mamãe!

                — Ele a dopou?

                — Não. Ela saiu para passar a noite em... uma vigília na igreja. Ela tem feito muito isso... E aí ele... ele... — Baixou a cabeça envergonhado. — Ele me fez fazer coisas... e depois... usou... Ele... usou... coisas em mim... — Duas lágrimas grossas pingaram. — Ele pôs... Ele...

                — Ele usou uns brinquedinhos, eu sei. Conheço bem a coleção que ele tem. Comigo foi assim também! — Joe cortou tão amargo quanto o irmão. — Ele é um monstro Nick. Vamos denunciá-lo.

                — Ele não.... Ele... não...

                — Isso não diminuiu a gravidade do que aconteceu.

                — Porra! Não! Nunca! Eu não vou falar e você também não vai! — Transtornado Nick batia no que encontrava jogando tudo longe. Chutou as cadeiras, empurrou a mesa e se jogou contra a geladeira com força, se machucando ainda mais. Joe o agarrou por trás para contê-lo e chorou com ele. — Eu não vou viver se alguém souber. Me deixe fazer de conta que nunca aconteceu. — Tremendo Nick se agarrou ao irmão. — Eu só quero tomar um banho e voltar para casa...  Ninguém pode saber! Nunca! Ninguém vai saber, ninguém nunca, por favor. Prometa por favor.

               — Ninguém vai saber Nick. Eu prometo. — O virou e o fez encará-lo. — Mas você não vai voltar para aquela casa. Eu vou cuidar de você agora e depois vou buscar a mamãe. Vocês vão viver comigo aqui. Aquele homem nunca mais vai tocar em você ou nela. 

                O menino se libertou do abraço.

                — Você nunca, nunca vai contar o que ele fez. Eu me mato se você contar para alguém. Entendeu?

                                                                                                                           ◆◆◆

               Como Nick não o deixou ajudá-lo, Joe o encheu de recomendações de como se lavar. Enquanto o menino tomava banho trocou de roupa vestindo um jeans e pulôver pretos. Calçou coturnos pesados. Nick saiu do banheiro usando uma camiseta e bermuda emprestada do irmão.

                Mantinha os olhos baixos. Trazia na mão o pijama e a toalha que usou.

                — Quero queimar isso. — Disse mostrando a trouxa de roupas rasgadas e ensanguentadas.

                — Tem certeza? São provas contra o doutor.

                — Tenho. Não quero que ninguém saiba. Você prometeu!

                — Tudo bem. Faremos isso depois! Agora vem, deixa eu por gelo nesse olho. — Entrou no quarto e se sentou na cama. Nick o olhou receoso. — Eu sou gay Nick, não pedófilo. Há uma diferença muito grande entre as duas coisas.

O menino tremia quando se acomodou ao lado dele. Joe cuidou do olho roxo e do ferimento no canto da boca. Fez tudo com carinho e cuidado evitando tocá-lo além do necessário. Quando terminou tirou dois casacos do armário. Com o mais longo envolveu o irmão cobrindo-o todo. Os olhos do garoto se encheram de lágrimas.

                — Nick fique com meu celular. Espere uma mensagem minha avisando que está tudo bem. Vou te deixar na casa de Darla, diga aos Scot que eu pedi que me esperasse lá. Não pode ir para a casa de Nathaniel ou do tal Rick, porque se algo me acontecer será com eles que o doutor vai procurá-lo.

                — Aonde você vai? — Perguntou assustado quando Joe levantou e vestiu o outro casaco.

                — Vou buscar a mamãe.

                                                                                                                           ◆◆◆

               Antes de sair Joe desceu para o pequeno porão onde estavam guardadas as quinquilharias de todos os que, um dia, moraram no chalé. Levava as roupas de Nick em um saco plástico. Meio receoso afastou a tabua solta da parede atrás da máquina de lavar e puxou um saco preto. Dentro dele, em outro saco, desta vez transparente, o uniforme de Hans. Abriu e tirou a camisa branca. A peça foi lavada mesmo assim as manchas avermelhadas nos punhos e no peito podiam ser de sangue. Era sangue, ele sabia desde aquela tarde fatídica. E se era sangue, seria da amiga?

                Fazia-se a pergunta há meses e tinha medo da resposta.

                Apesar da busca que polícia fez ninguém encontrou as roupas que Hans usava naquela tarde maldita. Quando foi para a festa deixou as peças lavando na máquina antiga e havia tantas caixas empilhadas sobre o eletrodoméstico velho que os policiais não perceberam que ainda era usado. Quando voltou ao chalé, depois do depoimento a polícia, as tirou da máquina, colocou em um saco plástico e escondeu. Porque tinha guardado aquilo não sabia.

                Colocou as de Nick junto e jogou no buraco da parede. O melhor mesmo era queimar tudo, mas faria outra hora, precisava se apressar. Pregou a tábua solta, colocou a máquina na frente e deixou o porão.

                                                                                                                           ◆◆◆

                Entrou na casa em que cresceu devagar. Estranhou o silêncio. Era cedo, mesmo assim a mãe já deveria ter voltado da vigília àquela hora. Preocupado se perguntou onde o doutor estaria. Caminhou até o quarto. A mãe parecia dormir.

                Aproximou-se. Celeste estava pálida e fria. Tenso a sacudiu, e chamou sem resposta. Assustado tirou o telefone do bolso e ligou para emergência. Saltou para o lado aterrorizado quando ouviu a porta abrir e o doutor entrar.

                — Imaginei que o moleque iria te procurar! — Neil sorria cruel. — Não fique enciumado Joe. Ele foi bem, mas você é muito melhor.

                — Maldito!! O que fez com ela? — Joe o interpelou furioso.

                — Ela viu o que não devia! Disse que iria passar a noite na igreja e voltou para casa no meio da madrugada. Mentirosa! Vadia! Precisei dar umas coisinhas para apagar a memória dela... e ao mesmo tempo me librar de outro bastardo!

                — Não vai escapar dessa. Nick está no centro médico. Vamos denunciá-lo!

                — Mentira. Se tivesse feito isso a polícia já estaria aqui e não você, sozinho, tentando bancar o herói.

                — Eu já chamei ajuda, guardei as roupas de Nick! Todos vão saber o que fez. Não vai se safar. Vão provar que você a drogou...

                — Eu? — O médico riu tranquilo. — Sua mãe é suicida. Ela tem antecedentes. A mistura que fez é comum..., mas eficaz. Nada pode salvá-la agora. E mesmo que ela escape o bastardo com certeza não vai.

                — Desgraçado! Assassino! — Joe avançou contra ele.

                A raiva transbordava. Queria matá-lo, queria fazê-lo sofrer, queria vingança. Neil apenas riu com o ataque, segurando-o pelas roupas sem qualquer esforço. Quando se cansou armou o pulso e o socou. Joe caiu. O médico pisou no peito dele como gostava de fazer.

                — Acho que vou me livrar de você também. Já me cansei desse seu comportamento comigo, afinal eu sou seu pai!

                — Maldito! Infeliz! Me larga!

                — Acho que não. — Sem que Joe esperasse Neil levou a mão as costas e puxou a pistola. Apontou entre os olhos do garoto que parou de tentar se livrar. — Hummm. Qual será a história? Preciso pensar para poder atirar no lugar certo... — Virou a arma para a mulher adormecida — Ou será melhor atirar nela?

                — Não... por favor...

                — Não?! — O médico riu. — Você não seria estúpido de deixar o garoto sozinho naquele seu muquifo. — Engatilhou a arma.                  — Onde ele está? — Joe travou os lábios apesar do medo. — Não importa ele vai voltar aqui uma hora ou outra. Onde escondeu as roupas dele?

               — Mesmo que nos mate a polícia vai investigar e vai entender o que aconteceu aqui e...

                — A polícia não sabe investigar nada. Nick não vai abrir a boca. A cadela de sua mãe não vai se lembrar, o que ela tomou apaga tudo. E você vai simplesmente desaparecer. Não seria o primeiro do bairro a sumir no sem deixar rastros. — Ele riu cruel. Joe tremia e lágrimas grossas escorriam pela face. — É fácil sumir com uma pessoa aqui. O bosque tem muitos recantos... Ah... meu filhinho está assustado! — O médico riu de novo, e de novo e por fim gargalhou. — É muito divertido te ver assim.

               Ergueu a arma ajustando a mira. Joe fechou os olhos.

                De repente algo fez com que o doutor fosse jogado longe. A arma caiu ao lado da cama. Joe se encolheu em posição fetal, cobrindo a cabeça apavorado sem conseguir ver que quem enfrentava o médico.

                No canto do quarto Neil Spencer levantava devagar encarando, com um inesperado respeito, o homem atarracado que o desarmou.

                — É hora de sair de cena Volod. — O Reverendo Sullivan disse no mesmo tom sisudo dos sermões. — Já cumpriu sua triste missão.

                — Não se atreva a se envolver reverendo! — Exigiu. — Não tem poder aqui! — O médico sibilou a expressão se transformando em uma máscara de ódio e repúdio.

               — Não preciso de poder para vencê-lo! — David Sullivan disse frio.

                Os dois homens se aproximaram para o embate.

                Neil Spencer tentou um soco que cortou o vazio com a esquiva ágil do oponente. Um segundo foi interrompido por um golpe rápido que desviou o punho e na sequência o acertou na garganta. A dor o fez dar um passo para trás perdendo a vantagem enquanto o outro avançava dominando com golpes rápidos e sequenciais no rosto, peito e ombros. Foi acuado contra a parede, os braços de ambos entrelaçados medindo forças. O cotovelo no pescoço lhe talhava a respiração. Tentou avançar, mas a força que o mantinha preso era maior.

                Os olhos negros do reverendo cintilavam.

                — Já o suportei mais do que deveria. Você vai renunciar há todo e qualquer direito que tem sobre esta família. Ou por Deus, eu juro perco meus votos, mas vou fazer uso de outro tipo de justiça. — Disse pressionando mais o braço.

                — Não pode... — O doutor ainda tentou...

                — Não posso? — Uma adaga fina deslizou da manga da batina para a mão enluvada o clérigo. Ela foi cravada lentamente até o cabo, no ombro do oponente que gemeu. — Saia, enquanto pode sair vivo.

               A ordenança no olhar deixava claro que o homem não blefava. Dez centímetros em diagonal e a adaga encontraria o coração. Um movimento sutil demonstrou que a intenção era deslizá-la por dentro do corpo até atingir seu órgão vital. Os olhos cintilaram de raiva por alguns segundos denunciando o embate entre obedecer ou se rebelar.

                Assentiu curvando os ombros e baixando a cabeça. Tão rápido quanto foi dominado foi solto e teve apenas um vislumbre da adaga sumindo nas mangas das vestes do clérigo. Cobrindo o ferimento profundo com a mão foi para a porta.

                — Se tentar algo... — David Sullivan sibilou e o monstro parou para ouvi-lo. — ...por menor que seja eu saberei.

               Joe encolhido no chão como estava não se moveu. Assustado ouviu a porta ser aberta e de repente o ar estava um mais leve. Ainda tremia quando mãos fortes o segurou pelos braços levantando-o com cuidado e carinho. Quis reagir mais não tinha forças. Foi colocado sentado e abraçado. O peito que o acolheu era conhecido e ele relaxou aspirando o aroma de que tanto sentiu falta. Estremeceu sem acreditar e da descrença tirou forças para se afastar. Olhou em volta e encontrou o olhar do reverendo Sullivan atento a ele e a quem o abraçava.  

                — Obrigado — Murmurou sabendo que o clérigo o salvou.

                Se aconchegou nos braços que o amparavam mirando o rosto que não via há meses. A primeira coisa que percebeu foi que os cabelos loiros estavam mais longos do que antes, no par de olhos cinzentos, as írises agora possuíam rajadas caramelo e a pupila era dourada. A boca continuava desenhada, linda, pronta para ser beijada e o sorriso preocupado que recebeu lhe deu a certeza de que não estava sonhando.

                — Oi Pasiune[1]! — Donovan sussurrou apertando-os nos braços.

                                                                                                                           ◆◆◆

                — Oi mãe! — Joe sussurrou quando ela abriu os olhos.

                Celeste olhou ao redor reconhecendo o próprio quarto. Gemeu angustiada sem acreditar no que havia acontecido. Os olhos encheram-se de lágrimas que ela conteve com custo. 

                — Nick?

                — Nick está bem mamãe! — Tentou sorrir para a mãe — Já o avisei e ele está vindo para casa.

                — Neil?? — Quis saber assustada.

                — O reverendo ouviu nossa briga, veio aqui e o pôs para correr.

                — Nick... Neil... eu vi...

                — Eu sei.

                — Me perdoe Joe. Por favor me perdoe...

                — Vai ficar tudo bem mamãe. Nick não percebeu que a senhora viu o que aconteceu. O pastor não sabe o que houve com Nick e ele não quer que ninguém saiba então não vamos contar...

                — Nick estava desacordado e Neil... Neil estava... Oh Deus! Eu... ele me bateu e depois me fez tomar algo... — Lembrou assustada. — Eu perdi o bebê? — Perguntou receosa tocando o ventre devagar.

                — Não. Ela também está bem. — Joe disse acariciando a mão tão parecida com a sua. Ele era muito parecido com a mãe e agradecia a Deus por isso. Imaginava o que teria herdado do pai e se um dia saberia quem era ele. — Durma. A senhora precisa descansar.

                — Nick... Neil... ele fez... Oh Joe... Me perdoe...

                — Está tudo bem! Descanse mamãe. — Pediu com carinho.

                Celeste acariciou o ventre, virou-se na cama e chorou baixinho.

                O reverendo conversava com os paramédicos quando chegou na sala. Minutos antes sugeriu que o melhor era não falar sobre a arma, sobre a discussão com o médico ou envolver a polícia. Pediu segredo sobre o que aconteceu. Garantiu que Neil Spencer nunca voltaria a atormentá-los.

                — Como pode garantir isso? — Joe quis saber confuso.

                — Eu sou um reverendo Joe. Sei os segredos desta comunidade, incluindo os do seu... padrasto. Eu perco os meus votos, mas posso fazer uso do que sei e ele teme isso. — Explicou depois de socorrer Celeste, pouco antes da ajuda chegar.

               Joe baixou os olhos. Nick também queria manter o que aconteceu em segredo, e o reverendo não sabia o que o médico fez com o irmão. A mãe também não falaria. E ele nunca poderia agradecer o que David Sullivan fez pela mãe e pela irmã. A forma rápida como agiu, fazendo-a vomitar, levantando-a, tocando a barriga dela e reanimando a ela e ao bebê.... Estremeceu lembrando a arma apontada para entre os olhos. Nunca teve tanto medo. E foi salvo por aquele homem sisudo e estranho que sempre esteve perto da família. O mínimo que podia fazer era atendê-lo e manter tudo aquilo em segredo como pediu.

               Já o loiro atlético continuava escorado no umbral entre a sala de estar e jantar observando-o atentamente. Joe olhou ao redor e viu o policial Sinclair, que veio para registrar a ocorrência, ouvir a versão do clérigo.

Mordeu os lábios indeciso, mas se aproximou.

                — O que veio fazer aqui Don? — Quis saber contendo a irritação.

                Oito meses! Oito meses se passaram desde a última vez que se encontraram no mirante. Oito meses nos quais foi sumariamente ignorado, em que não teve as mensagens respondidas, sequer visualizadas, em que todas as ligações foram rejeitadas, os recados menosprezados. Oito meses que não soube onde ele estava ou o que estava fazendo. Oito longos meses de silêncio e desprezo.

                Oito meses e o infeliz continuava lindo, ainda mais forte e atlético. Mirou os olhos semicerrados buscando confirmar a estranha cor que viu quando foi abraçado. Havia sido mesmo imaginação. Os olhos não pareciam os mesmos, mas havia apenas algumas rajadas de caramelo na íris. Deu mais um passo arqueando a sobrancelha aguardando a resposta, já com o rebate na ponta da língua.

                Só não esperava que a boca desenhada, em vez de falar, tomasse a dele, desarmando a língua afiada em um duelo de desejo e saudade. O beijo foi longo, intenso, cheio de mágoa e dor. Quando o ar faltou Don o largou por alguns segundos, que Joe usou para olhar ao redor chocado. Havia estranhos na sala. O reverendo estava na sala, paramédicos estavam na sala, Sinclair estava na sala. Tentou recuar, mas a mão na nuca que o mantinha junto ao corpo forte desceu e pareada com a outra, guiada por braços longos o puxou ainda mais. Ouviu o próprio nome ser sussurrado e sussurrou o do ex amante. E foi novamente beijado de uma forma que o prefixo ex mostrou-se inútil.

                                                                                                                           ◆◆◆

               Assim que a polícia saiu e o reverendo foi conversar com Celeste, Joe e Donovan sentaram no quintal dos fundos. Don o puxou para os braços mantendo-o preso. Joe não quis se libertar. Estava aquecido e sentia-se protegido entre eles. Quando Don falou respondeu à pergunta feita.

                — Eu estou aqui porque percebi que não posso viver sem você, Pasiune. Eu voltei para vivermos este ciclo juntos como Hans queria. Não quero passar os próximos cem anos desejando tê-lo em meus braços enquanto você se degrada por aí... Somos pares temos que ficar juntos ou sofremos a dor intensa da ausência. Teremos outros quatro ou cinco ciclos antes de sermos alinhados novamente. Temos que entrar em harmonia neste tempo para podermos enfrentar e derrotar o inimigo de todos no tempo certo.

               — Agora é você que vai falar por incógnitas?

                Donovan riu baixo. Pegou a mão dele e a beijou.

                — Eu voltei porque te amo e quero que seja meu namorado.

                — Don...

                — Namorado, sem segredos e sem esconder de ninguém.

                — Você sabe que eu não consigo... não consigo...

                Donovan suspirou tenso. Apertou os lábios magoado.

                — Vou te deixar livre Joe. Sem cobranças ou compromissos, mas vamos ficar juntos, a vista de todos, não vamos nos esconder. Só peço que... não faça nada na minha frente ou eu posso acabar preso.

Joe riu nervoso. Donovan o abraçou.

                — Don... e... Você sabe... Você tem notícias de Hans??

                — Ele se foi naquele dia Joe. Ele se despediu de nós em casa e não percebemos. — Juntou as mãos e as colocou entre os dois, sobre o coração de ambos. — Agora ele vive aqui. No seu e no meu coração. — Joe começou a chorar baixinho. — Ele está aqui e sempre estará conosco. Não tenho muito a oferecer a não ser meu coração Pasiune. Não o rejeite. Eu te amo!

O momento terno foi interrompido por um grito indignado.

                — Que merda é essa?

                Nick voltou para a casa depois que recebeu a mensagem de Joe. Ainda com medo deu a volta para entrar pelos fundos. Agora encarava o irmão nos braços de um cara e fervia de ódio.

               — Você não vale nada mesmo! — Gritou e saiu correndo.

               Joe bufou e gritou o nome do irmão que se afastava rápido. Levantou impaciente. Deu alguns passos para seguir o garoto, mas voltou e deu um beijo rápido em Donovan.

                — Volte mais tarde para conversamos. — Pediu e correu atrás do irmão.

                                                                                                                           ◆◆◆

                Nick era um garoto e era rápido. Joe era um bailarino e era veloz. Conseguiu alcançá-lo antes do fim da rua. O agarrou contendo-o em um abraço forte enquanto o menino se debatia xingando e esbravejando.

                — O doutor foi embora Nick. O doutor foi embora e nunca mais vai voltar! — Disse e repetiu até o menino parar de se debater e apenas chorar em seus braços. — Ele tentou me bater, eu gritei, o reverendo estava na rua, ouviu, entrou, eles brigaram e o reverendo o pôs para correr e o ameaçou e ele nunca mais vai voltar. —  Resumiu. Não precisava contar mais do que isso. O garoto já estava muito traumatizado. —  Estamos livres. O que te aconteceu não vai se repetir. Você não vai precisar suportar todas as quartas....

                Nick congelou. Se afastou para olhar para o rosto do irmão.

                — Toda quarta...??

                — Toda quarta... por dois anos inteiros, ou mais não sei...

                — Filho da puta! — O garoto disse e se agarrou ao irmão, desta vez em um abraço protetor. — Maldito, filho da puta! — Os lábios tremeram e as lágrimas que rolaram abundantes já não eram mais por ele

                — Não deixa a mamãe ouvir esse palavreado. — Joe tentou gracejar depois de alguns minutos.

                — Ela está bem? A bebê está bem?

                — Esta sim. Em casa eu conto melhor o que aconteceu. — Joe olhou ao redor. Naquele horário da manhã as pessoas se deslocavam para a escola, o trabalho e os transeuntes olhavam para os dois parados abraçados no meio da calçada curiosos. — E melhor irmos.

                — Não vou para o colégio. — Nick disse bravo.

                — Não pretendia mandar você ir.

                — Você não manda em mim. — Fungou tomando o caminho de volta pisando duro. Quando estavam próximos viram Donovan e o reverendo saindo da casa. Don acenou e sorriu terno. — Por que aquele cara estava aqui?

                — Ele estava com o reverendo quando ouviram os meus gritos. —  Nick deu um pequeno sobressalto. —  Calma, nenhum dos dois sabe o que te aconteceu. Ninguém sabe e eu nunca vou contar!

                O menino baixou os olhos constrangido.

                —  Obrigado. — Murmurou. O olhar foi atraído para Donovan e o reverendo que viravam a esquina. O menino fechou a expressão com raiva. —  O que ele quer com você? Por que vocês estavam abraçados? Você não namorava o primo dele?

                — Namorava. Mas agora vou namorar com ele.

                O garoto estancou na porta. Apertou os lábios furioso.

                — Ah, mas nem fodendo!!

 

[1] Paixão!

Nora Stone pseudônimo registrado de
N. F . A. Rocha -  
CPF 261.xxx.xxx-06  - Rua Peri, 105 - Embu das Artes- SP Tel (11) 932042943 -
E-mail norastoneescritora@gmail.com

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Todos os direitos reservados - ISBN  978-85-920569-0-2
Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida. 

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